Re-inventando Anna

Imagem: Netflix

Série de sucesso da Netflix, lançada em fevereiro passado, Inventando Anna conta a história de Anna Delvey, nome adotado pela russa Anna Sorokin, acusada de golpe financeiro na elite nova-iorquina. História verídica exceto pelas partes que foram inventadas.

Me diga, tem um pouco da Anna Delvey dentro de você?

Grifes, festas, viagens, bebidas, celebridades, glamour. Bem vindo ao fantástico mundo que muitos querem, poucos têm e todos invejam.

Anna se mostra na série como uma menina arrogante, porém simpática quando era do seu interesse. Anna se mostra amigável e generosa, diga-se pelas "gordas gorjetas" que oferecia quando havia interesse em ser - a concierge, Neff se encantou pelos grandes presentes, e a compensou com seus favores e com sua leal amizade. Por intermédio de Neff, o nome de Delvey foi para a lista vip da cidade. Anna queria ser aceita pelo mundo que acreditou ser o perfeito e lutou para isso mergulhando na sua fantasia. E quem não quer ser aceito pelo mundo?

Anna é russa, criada na Alemanha, vinda de uma família classe média. A série relata humilhações devido à nacionalidade, ao poder financeiro, aos pais poucos receptivos aos desejos da filha. Tudo isso, além da sua personalidade, fez Anna estudar e mergulhar no glamoroso mundo da moda, chegando em Nova Iorque com sua falsa identidade de Anna Delvey, apresentada por ela como uma "herdeira alemã". Com seu sotaque arrastado e sua postura de "a pobre menina rica", Anna se infiltra no mundo do dinheiro e do poder, tornando-se próxima às pessoas ricas e influentes. O mundo de Anna gira em torno da rede social, com fotos de jantares, viagens, amizades e selfie feliz - o pacote completo para uma jovem de vinte e cinco anos se perder nas suas mentiras e vivê-las como realidade, aumentando cada dia mais suas neuroses.

A protagonista cita o "pai" milionário, que a repreende e a salva, o tempo todo, criando uma imagem que em nada lembra seu verdadeiro pai austero e rude. Na sua fantasia, ela possui fortuna no seu fundo fiduciário, mas na realidade ela chegou a estagiária de moda.

E com sua carinha bonita, Anna vai se influenciando pelo mundo do luxo e da boa vida, sem nenhum dinheiro. Apenas contando sua mentira e lutando para que as pessoas compre-a como verdade, abrindo caminho para Anna aproveitar e ostentar as vantagens alheias.

Com o tempo, Anna passou a deslumbrar a ideia de abrir uma "fundação" com o seu nome, a Fundação Anna Delvey, refúgio da arte e do luxo, no coração de Manhattan. Para concretizar seu delírio, reúne os melhores profissionais, dentre eles os mais importantes bancos e nomes do mercado financeiro nova-iorquino, que vivem com ela a realização de um sonho, o qual depende de um grande financiamento. Um sonho que ela quase tornou realidade. Faltou pouco.

A pergunta que fica: como Anna enganou tantas pessoas? A resposta bem simples: nós, seres humanos, acreditamos um no outro. Nós queremos acreditar no outro, mesmo com indícios duvidosos. Acreditamos até desacreditarmos.

Anna está presente em mim em você. Quando não aceitamos a realidade como ela se apresenta. Quando não conseguimos trabalhar com nossa frustração (terapia, gente!). Quando mantemos amizades e contatos por interesse (quem nunca?). Quando criamos uma mentira, sabemos que é mentira, mas vivemos como se ela fosse verdade.

"Anna" e "Anno" são mais comuns do que imaginamos. Delvey ou Sorokin, como preferir, se destacou por sua força, coragem, inteligência e determinação. Sua audácia e persistência. Ela não foi amadora, mas caiu porque a verdade sempre vem à tona. E a verdade liberta, mesmo na prisão.

A história de Anna foi relatada por uma jornalista, virou série, livro e outros projetos adiante. Nesse momento Anna já cumpriu sua pena, mas retornou à prisão por seu visto vencido em território americano.

A história de Anna ainda não acabou, sugiro estar começando.

Redação:

Silvia Delforno, psicanalista.

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Foto: Netflix.com